A fibrose do fígado faz parte das alterações estruturais e fun­cionais na maioria das doenças crônicas deste órgão. É um dos principais fatores de prognóstico visto que o grau da fibrose está correlacionado com o risco de desenvolver cirrose e complica­ções relacionadas ao fígado em doenças crônicas virais e não virais 1,2. A biopsia hepática foi tradicionalmente considerada o método de referência para a avaliação das lesões no tecido hepático. Os patologistas têm proposto um sis­tema robusto de pontuação para estadiar a fibrose do fígado, como a pontuação semiquantitativa METAVIR 3,4. Além dis­so, a medição morfométrica da área proporcional de colágeno, uma técnica parcialmente automatizada auxiliada por compu­tador, proporciona uma avaliação precisa e linear do volume da fibrose 5.

 

A biopsia do fígado representa uma imagem e não um conhecimento das mudanças dinâmicas durante o processo de fibrogênese. No entanto, a avaliação imunohistoquímica dos marcadores celulares, tais como a expressão da actina do músculo liso para a ativação de células estreladas hepáticas, citoqueratina para rotulagem da proliferação ductular ou CD34 para a visualização da capilarização endotelial sinusoidal ou a utilização de técnicas de microscopia de fluorescência para avaliação espacial do colágeno fibrilar, pode acrescentar informações “funcionais” 6,7.

 

Todas estas abordagens são válidas desde que a biopsia seja de tamanho suficiente para representar todo o fígado 4,8. Na ver­dade, a biopsia do fígado fornece apenas uma pequena parte do órgão inteiro e existe o risco de esta parte poder ser não repre­sentativa do volume da fibrose hepática em todo o fígado devido à heterogeneidade na sua distribuição 9. Dados extensos da literatura revelam que o aumento do comprimento da biopsia do fígado diminui o risco de erro da amostragem. Exceto na cirrose, para a qual os microfragmentos podem ser suficientes, uma biopsia com 25 mm de comprimento é considerada uma ótima amostra para uma avaliação precisa, apesar de 15 mm se­rem considerados suficientes na maioria dos estudos 10. Não só o comprimento, mas também o calibre da agulha da biopsia é importante, a fim de se obter um fragmento de fígado de ta­manho adequado para avaliação histológica, sendo a agulha de calibre 16 considerada como a mais adequada  para a biopsia hepática percutânea 11.

 

A variação interobservador é outra limitação potencial da biop­sia hepática, relacionada com a discordância entre os patolo­gistas na interpretação da biopsia, embora pareça ser menos pronunciada quando a avaliação da biopsia é feita por patolo­gistas especializados no fígado 12. Para além dos problemas técnicos, a biopsia do fígado é um procedimento caro e invasivo que requer médicos e patologistas suficientemente treinados, a fim de obter resultados adequados e representativos – isto limita novamente o uso da biopsia hepática no rastreio em massa. Por último, mas não menos importante, a biopsia do fígado é um procedimento invasivo, comportando um risco de complicações raras, mas potencialmente fatais 13,14. Estas limitações con­duziram ao desenvolvimento de métodos não invasivos para a avaliação da fibrose do fígado. Embora alguns destes métodos sejam agora amplamente utilizados em doentes para uma ava­liação de primeira linha, a biopsia permanece dentro do arsenal dos hepatologistas na avaliação da etiologia das doenças com­plexas ou quando há discordâncias entre os sintomas clínicos e a extensão da fibrose avaliada por abordagens não invasivas.

Considerações gerais

  • Mesmo que a biopsia do fígado tenha sido utilizada como método de referência para a concessão, avaliação e valida­ção de testes não invasivos, é um padrão-ouro imperfei­to. A fim de otimizar o valor da biopsia do fígado para avaliação da fibrose, é importante seguir as seguintes re­comendações:

  • Comprimento da amostra >15 mm por uma agulha de 16G;

  • a utilização de sistemas de pon­tuação apropriados de acordo com a etiologia da doença do fígado; e

  • Leitura por um patologista experiente (e, se possível, especializado).

  • Os testes não invasivos reduzem, mas não suprimem a necessidade da biopsia do fígado; eles devem ser usados como um sistema integrado com a biopsia do fígado de acordo com o contexto.

 

Referências

  1. Yano M, Kumada H, Kage M, Ikeda K, Shimamatsu K, Inoue O, The long-term pathological evolution of chronic hepatitis C. Hepatology 1996;23:1334– 1340.

  2. Younossi ZM, Stepanova M, Rafiq N, Makhlouf H, Younoszai Z, Agrawal R, Pathologic criteria for nonalcoholic steatohepatitis: interprotocol agreement and ability to predict liver-related mortality. Hepatology 2011;53:1874–1882.

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